Algumas Questões Sobre Grupos de Trabalho e Seus Estilos de Funcionamento

Autora: Jane Cherem Corte Bezerra da Silva

 

Abordar os estilos de funcionamento dos grupos de trabalho, impõe uma investigação no campo da linguagem, e convoca os administradores a colocarem-se como parte integrante do objeto deste estudo, pois é fazer leitura das ligações sociais que se estabelecem, do que se passa no que se diz e faz nas empresas, e das conseqüências disso para os resultados do trabalho. Nas palavras de Jacques Lacan, "temos que precisar o liame entre aqueles que falam", ou seja, temos que investigar não tanto o que os sujeitos dizem, mas de onde dizem, de que lugar se colocam na relação ao outro/Outro.

O exercício de precisar esta leitura das interações que se estabelecem entre os sujeitos, é um trabalho que quando nos colocamos a realizá-lo, vai deixando claro que para além da pretendida "intersubjetividade", existem estruturas em funcionamento modelando o que queremos chamar de "relações". Nossa pretensão de entender a intersubjetividade no modelo das relações biunívocas que são possíveis no campo da matemática, elemento a elemento, como a que descreve a teoria dos conjuntos, aqui no campo da interação humana, ela não se dá. É a questão que se coloca para a lingüística moderna, isto é, a de saber de que maneira a palavra tem relação com a significação que o falante lhe pretende dar ou, como é que o signo se relaciona ao que ele significa. "A palavra pode ser enganadora"(Santo Agostinho). Mas também a palavra é reveladora. Ela tem uma dupla função: enquanto pretende esconder, ela mostra. Esconde e mostra o funcionamento do sujeito, dos agrupamentos e das interações que aí se estabelecem.

Portanto, neste campo da linguagem, sempre aberta a infinitas significações, o que encontramos são elementos reais se articulando, em um movimento regido por duas leis: metáfora e metonímia ou condensação e deslocamento. Uma palavra, uma letra, um som, substituindo outro e a "escolha" aleatória do falante que sempre "diz muito mais do que pretende". Não temos os pensamentos ou as palavras, são eles que nos têm.

Logo, a imagem de dois sujeitos intencionalmente conversando, trocando mensagens, um EU que sabe o que diz, é algo ilusório. É o que desde Freud nos foi demonstrado na subversão do sujeito cartesiano que ele produziu, transgredindo o saber da sua época. Ele aponta para um outro campo: o inconsciente.

Assim, ao nível da consciência temos os enunciados, o discurso, ao passo que a enunciação fica escondida, está sempre implícita sob um enunciado, enunciação que é ponto de partida para a cadeia simbólica, a cadeia de significantes que representa o $ujeito do inconsciente.

O que existe, então, neste campo e que ultrapassa a consciência, é o movimento significante, que nos habita, indução significante, falação no mundo, que nos atravessa, nos faz presas e nos faz falar. Leis da linguagem em funcionamento. Então o que nos resta é falar, falar e falar...e ver ir se produzindo, como resto, o fracasso da pretendida "comunicação".

As conseqüências disto para as chamadas "relações" entre sujeitos e grupos, não passam despercebidas de ninguém, mesmo que estes sujeitos não saibam disto. Todos experimentamos o mal estar que é a nossa comunicação.

Freud num texto escrito em 1895, quando iniciava suas escavações neste campo, nos brinda com uma passagem onde descreve o nascimento da comunicação humana. Diz ele: "O organismo humano é, no princípio, incapaz de levar a cabo esta ação específica, (ele estava se referindo a uma intervenção no mundo externo para aporte de alimentos, aproximação com o outro) realizando-a por meio da assistência alheia, ao chamar a atenção de uma pessoa experimentada sobre o estado em que se encontra a criança, mediante a condução da descarga pela via da alteração interna (por exemplo, mediante o pranto da criança). Esta via de descarga adquire assim a importantíssima função secundária da compreensão (comunicação com o próximo), e a indefensão original do ser humano converte-se, assim, na fonte primordial de todas as motivações morais". Este trecho nos coloca em cheio nos mecanismos de funcionamento da ilusão da comunicação humana, submetida ao acaso e probabilidade do real da linguagem, e rasga todas as nossas românticas intenções, sempre tão presentes neste campo da vida.

Pois bem, aproximar-nos-emos deste terreno - os estilos que vão assumindo as interações entre os sujeitos e grupos apoiando-nos num aparelho de abordagem, uma referência matemizada por Lacan que são seus DISCURSOS, por ele demonstrado que são da mesma ordem da linguagem. Por ordem da linguagem, devemos entender todo o campo significante, a rede completa dos signos, portanto inabordável como um todo, possível somente aos pedaços, palavra a palavra.

Este tema, portanto, implica em considerarmos a existência da linguagem, dos significantes, inabordáveis às vezes, ou inacessíveis, mas Reais, e que estão a produzir conseqüências em nossos pensamentos, em nossas falas e em nossos atos. Constituem o que chamamos o recalcado. Embora esta lógica do inconsciente, que é a lógica da linguagem, pareça um pouco estranha para nós que nos acostumamos a pensar dentro da lógica formal, não é difícil demonstrá-la: várias vezes nos deparamos conosco mesmos falando coisas que não gostaríamos, esquecendo nomes, trocando letras, ou vendo tal discurso sair da nossa boca revestido de sentidos e ganhando encaminhamentos que não esperávamos. É a existência da linguagem funcionando em sua independência, em sua lógica metaforonímica, atravessando nossa intencionalidade.

Com referência ao conceito de DISCURSO, encontramos Lacan falando nos "Seminários", Livro 3: "Entre a significação e o significante há realmente uma relação, que é aquela que fornece a estrutura do discurso. (Ele fala em estrutura do discurso e não em sentido das palavras). O discurso seja o que vocês ouvem quando me escutam, e que existe - a prova é que às vezes vocês não o compreendem - é uma cadeia temporal significante".

(Desta palavra cadeia, também podemos procurar expandir nosso entendimento, pois o Aurélio fala em corrente de anéis o que nos indica uma "escolha" até ao ACASO( acaso que nos tempos atuais, já sabemos, é do campo das probabilidades, e não um acaso qualquer, mas um acaso "previsto" embora desconhecido a priori se podemos falar assim, pois o Real é legislado). A princípio todos os elos são potencialmente aptos a serem o sucessor, e no entanto, é utilizado um elo determinado a cada vez , e se fosse outro, a cadeia seria outra. Portanto, ele nos aponta para a estrutura, para o mecanismo de funcionamento e não para o sentido que nos entra pelos ouvidos...). "Distinguir a dimensão do significante só ganha relevo ao se colocar que o que vocês entendem, no sentido auditivo do termo, não tem nenhuma relação com o que isso significa. "

Logo temos que pensar DISCURSO como uma produção que se dá através de um determinado falante, e não como um produto dele, da sua autoria e intencionalidade.

 

 

Sobre o conceito de GRUPOS DE TRABALHO é costume se concordar que há um trabalho de equipe sempre que alguns profissionais são convocados a executar uma tarefa comum. Em outras palavras, há uma expectativa de que bastaria que se contratasse com um grupo de trabalhadores uma empreitada, para que já se pudesse esperar o início e os resultados de um trabalho de equipe. Não bastasse uma observação mais criteriosa do dia-a-dia das empresas para se reconhecer aí um engano, podemos ainda recorrer aos conceitos, para saber que uma equipe só se constitui quando seus participantes se articulam e dirigem suas ações a partir de um corpus conceitual comum.

Trabalhando em "grupos" logo vai ficando clara a distância que existe entre o que as equipes dizem e o que elas fazem. É o conhecido espaço do delírio, que nas conversas cotidianas assume disfarces de sonhos, esperanças, intenções, e assim caem no campo da "normalidade" e já não são mais reconhecidos como extravagâncias do imaginário. Assim como para o sonhante o sonho tem força de vivido, o delirante (que é um sonhador em vigília) não duvida das suas idéias e construções.

Este espaço do delírio na empresa não precisaria existir, pelo menos não tão amplo assim, e não podemos deixar de concordar que ele representa o "quantum" de produtividade final não ocorrida, ou seja, uma produtividade virtual, não realizada. Pois quando uma empresa contrata um engenheiro, ela não passa a contar com um engenheiro, e sim com uma parcela de engenheiro, que produz um determinado resultado líquido, descontadas as suas melancolias, suas dificuldades de entendimento, suas "certezas", seu estilo, como se diz.

Em outras palavras ela contrata uma competência virtual de engenheiro, que acompanha uma performance de um $ujeito (esse $ barrado é para representar o sujeito do inconsciente, faltante, sempre presente, mesmo quando desconhecemos isto e estamos fantasiados de indivíduo, indivisível, completo, muito inteiro a tropeçar nos nossos lapsos, esquecimentos, atos falhos, furos e faltas), logo ela contrata, sem se preocupar com isto, desavisada, uma "unidade carbono" destas tantas e tontas que somos por aí, como diz um colega meu, ou um frágil macacóide aí da tribo, e crê que contratou UM ENGENHEIRO.

"Mas justamente é por considerar que as coisas são espontâneas que não vemos nada do que no entanto temos diante dos olhos."( 3) Portanto, equipe de trabalho já é algo bem conceituado e não é um "grupo" como se constitui a maioria do que se consegue por aí (ou por aqui).

Além de se resolver questões básicas como: clareza de objetivos, funções, papéis, resultados esperados, tempo e nível de qualidade pretendidos, e isto até a exaustão (como critério de cientificidade), também não se pode abandonar a tarefa de ir voltando a cada passo dado, para relê-lo, reanalisá-nos, corrigi-lo, se necessário, e isso incansavelmente. Na maioria das vezes, apaixonamos-nos irremediavelmente por "nossas" produções e não queremos mais sair deste espelho de imaginada completude...

Aqui, ao falarmos de equipe cabe nos utilizarmos de um outro conceito: o conceito de alíngua. O termo alíngua, escrito numa palavra só, quer significar o "dialeto" particular de cada um, palavras que, pela contingência familiar, no meio de todos os termos existentes na língua, fazem parte do repertório familiar (gestos, sons, significações próprias, que ganham força de "língua materna" para cada sujeito). É real que a língua existe e a língua falada sobre os sujeitos, ao seu redor, é alíngua.

Transportando este conceito para as empresas, pode-se criar uma alíngua conhecida e falada por toda uma equipe, para que estes enunciados existam como referência (lapidados até o nível de conceito) para o trabalho, uma linguagem comum a todos os elementos participantes da equipe para as questões da produção. Uma alíngua composta de conceitos, de diretrizes, de objetivos, de critérios, enfim de questões que dizem melhor do trabalho a ser realizado.

Voltando, escrevemos os DISCURSOS de Lacan com 4 lugares e com 4 elementos significantes. Os lugares, sempre fixos, são:

verdade <=> AGENTE => OUTRO <=> produção ou produto

 

Temos a VERDADE como motor disparador do discurso que se representa num AGENTE. Agente é o que provoca uma reação sobre outro. É o que fará um outro agir. Disto obtém-se um PRODUTO, que embora motivado pela VERDADE, vai se distanciar dela inexoravelmente.

Para abordarmos um DISCURSO, podemos seguir uma trilha que nos auxilia em como realizar esta análise: primeiramente, há um jogo aparente a ser escutado. Um jogo que é aparente pois se passa entre EU - TU , entre a função do AGENTE e a do OUTRO. E é um jogo aparente porque está "às claras", pode ser observado, e também aparente porque não é fruto da intencionalidade. Mas é um JOGO e pode ser escutado já com um ouvido atento a todas as dimensões da linguagem. Não podemos mais nos ater aos ENUNCIADOS e esquecermos que existe um espaço da ENUNCIAÇÃO ( só um profundo desconhecimento do estado atual da lingüística e sua conjugação com a psicanálise justificaria o não reconhecermos o que denomina-se SUBJETIVIDADE), desprezar que há uma VERDADE que latente, está a interferir, no que põe o AGENTE em ação, e no que ele produz a cada vez. "Enunciação é todo o trabalho para que se chegue a produzir um enunciado. Assim é que podemos falar em $ujeito da Enunciação e sujeito do Enunciado, enquanto que o $ujeito da Enunciação é o $ujeito do Inconsciente, o sujeito do Enunciado é o que aparece na fala."

Portanto, a VERDADE está ali organizando mais fundamentalmente o discurso. Podemos por isso perguntar: O QUE ou QUEM está ali interferindo, provocando, qual é, enfim a Verdade?

Depois, podemos passar a uma outra questão: "VISA O QUE, ESTE DISCURSO?"

Esta questão requer que localizemos o outro/OUTRO ao qual, no jogo aparente este Discurso se dirige. Pois nos tempos em que estamos (após Saussure, Jackobson, Chomsky), também sabemos que, a despeito do EU-TU ali presentes estarem a nos iludir de uma pretensa completude, o quanto cada um é um sistema complexo, com "história própria" que está incessantemente interferindo e "falando", fazendo reflexões, funcionando segundo algumas leis próprias, livre de qualquer intencionalidade, sistema que se constitui, finalmente, como o conjunto de tudo que já entrou e continua entrando no campo simbólico.

Precisamos perguntar também como é que este elemento - o outro/OUTRO - entra no jogo de quem dá as cartas (no caso, o Agente). Qual a função que ele preenche, este, em nome do qual há uma "relação" com a verdadeira alteridade, OUTRO do discurso, aquele que está realmente "dirigindo", guiando, exigindo-nos o tempo todo e está no lugar do PRODUTO.

Pois bem, isto bem localizado, passa-se para outra questão: "Qual é o PRODUTO que tal DISCURSO engendra?" Quer dizer, o que, esta estrutura discursiva PRODUZ? E assim, vamos finalmente encontrar o que, apesar do jogo aparente, está realmente sendo produzido (o produto dito desejado ou qualquer outra coisa, idéias, sonhos, prejuízos, uma turma, um reinado, etc.).

Em outras palavras, nossa leitura de um DISCURSO pode iniciar pelo jogo aparente, onde vamos encontrar o nível manifesto, isto é, o nível do sintoma manifesto, aquilo do qual a organização, os empregados e a administração se queixam e do que sofrem. E, imbricada nesta aparência, (o parecer), podemos (se pudermos), pesquisar a Verdade, que como água vai infiltrando todas as pretensões e mostrando suas conseqüências, queiramos ou não.

"O SINTOMA não é só o de que os sujeitos se queixam, mas também ele determina em grande parte a maneira segundo a qual sua EXISTÊNCIA ESTÁ ORDENADA."

Seria o caso de perguntarmos: existe um discurso que traduz o SINTOMA do empregador - empregado? Ou, existe uma estrutura específica do DISCURSO DAS EMPRESAS, a partir dos elementos e dos lugares que estão em jogo?

São os seguintes os 4 elementos que compõem a estrutura de um DISCURSO:

S2: que representa todo o campo significante, a linguagem, o SABER;

S1: qualquer massa significante que se abateu sobre o Sujeito, e isolada do S2 se pretenda referência do sujeito;

$ : sujeito do inconsciente;

a: o objeto "a", representação de qualquer objeto (e, se representa qualquer objeto é porque não é nenhum ).

No Livro XVII, encontramos Lacan falando para elucidar as funções do "senhor antigo"- o Mestre, e a do "senhor da modernidade", este que o capitalismo criou, e que se vale de uma outra face do SABER, a face articulada, o SABER-FAZER, o aparelho do qual o "escravo" não está desprovido. Este aparelho articulado é o que pode ser transmitido, "do bolso do escravo ao do senhor", por via que pode ser a do contrato de trabalho. Dá para ler neste texto, que o DISCURSO UNIVERSITÁRIO ( um dos quatro Discursos matemizados por ele), bem representa a estrutura do discurso do senhor da modernidade, da chamada empresa moderna. Para entendermos o que ele quis dizer, precisamos conhecer e estrutura no DISCURSO UNIVERSITÁRIO.

É a seguinte:

S2/S1 - a/$

O AGENTE neste DISCURSO que ocupa ali o lugar de dominante, está representado pelo significante S2, ou seja, todo o SABER. Então, um AGENTE que se especifica por TUDO - SABER (diferente de saber-tudo). Assim é que encontramos um "ADMINISTRADOR" que tudo-sabe, encarna o S2 e a partir deste lugar "dirige" a empresa, seus empregados, seus objetivos, seus destinos, enfim seus interesses. Nos comentários de Lacan, o "senhor moderno" se instala no Discurso Universitário.

O que realmente se produz em tal estrutura? O que este Discurso busca como produto a ser obtido é o sujeito. Na verdade é o outro que fica na posição de objeto, é o outro tornado receptor, e sempre aplaudido por isto, não podendo, realmente, ocupar a posição de sujeito. "Ele só é apelidado de sujeito... e com todo o orgulho!"

O que está sendo indicado e fica para nossa análise, então, é que se é no Discurso do Universitário que se instala a Empresa Moderna, aquilo que representaria um objeto "a", o resultado específico esperado da produção, não é o que este sistema produtivo busca, e nem é voltado a ele que se organiza. O PRODUTO são sujeitos, são eles próprios, produtos, "como se diz, consumíveis tanto quanto os outros, sociedade de consumo, dizem por aí". "Tornam-se produtos a serem consumidos socialmente."

Fica muito evidente nesta estrutura discursiva, e observável nas empresas onde podemos identificar este estilo de funcionamento - o Discurso Universitário - que há uma questão problemática relativa à produção, pois este Discurso inclui um tipo de sujeito (Agente) que vai ter um tipo de gozo, onde estará mais importando a ele, a relação dele ao outro, do que a qualificação, atributos, e profissionais que a empresa tenha. É o Discurso onde se instala o estilo de administração obsessiva. E na obsessão o gozo é Outro. O gozo não é o da produção do produto esperado. É mais o tormento, o atormentar, o se fazer atormentar...

E qual é a VERDADE que está ali organizando o trabalho? O QUE ou QUEM está ali provocando? É a Verdade que movimenta o AGENTE, portanto o patrão, seus motivos, suas necessidades, seus interesses, enfim, aquela massa significante que o move.

No texto "Cientificidade na Administração", e no Curso Análise Institucional, Velloso vem dizendo que o Discurso do Mestre na Empresa, ele propiciaria uma Administração mais racional, e apontando com todas as letras que o Discurso do Mestre é o discurso da empresa, o discurso da organização.

O matema do DISCURSO DO MESTRE é o seguinte:

S1/$ - S2/a

No lugar do AGENTE, por definição o patrão - representado pelo - S1 - , o que temos é um conjunto de convicções, de ideologias, de saberes, uma função realizada por alguém que vai vender o seu peixe, promover os encaminhamentos mais adequados para obtenção do produto, e de tudo que é inerente para a concretização do processo produtivo.

E a VERDADE, aí ? O Agente vem sustentado desde outro lugar e este outro lugar desde onde ele vem sustentado é o lugar da VERDADE. O Agente estará tentando representar uma instância originadora de algum movimento, ele vai ser o representante desta tal instância, e por isto mesmo não pode ser qualquer um, tem que ser dotado de condições para que o pretendido seja conseguindo, para propiciar a realização daquilo que o sujeito ($) no lugar da Verdade, projetou. (Aqui chama-se de $ tanto um vivente como um grupo de viventes que mobilizam um AGENTE, em função da VERDADE que se produz. )

Passando à outra questão, vamos procurar o que visa este Discurso. E localizamos o outro ao qual aparentemente o Mestre se dirige - o empregado. Este elemento entra no jogo pelo conjunto de SABER-FAZER que dispõe e pode disponibilizar na chamada "relação de trabalho". Pois sabe-se já, que é ao PRODUTO que o agente mais radicalmente se dirige. Este outro, é o outro onde mora o saber (S2), e não qualquer saber, mas aquele específico que possibilitará a realização daquilo que o $ maquinou.

No Discurso do Mestre, no lugar do PRODUTO encontra-se o a, ali representando o objeto específico a ser produzido. Logo, uma empresa que funciona neste discurso, vai se organizar de maneira exigente com relação aos saberes necessários, à competência sobre o produto e sobre o processo produtivo. Conseqüentemente, competências, especialidades, conhecimento aprofundado, são valores neste tipo de sistema.

Ainda tem uma questão importante que precisa ser dita: o Mestre pode, pelas condições da sua estrutura, funcionar pelo menos de duas formas. Ou este AGENTE em ação, se referenciará a um conjunto organizado de idéias, fará delas seu próprio MESTRE, ou poderá ser ele mesmo o MESTRE, corporificando este lugar. O que quer dizer, nas empresas, o seguinte: ou teremos um administrador que se submete a este conjunto de idéias, à TAREFA, ou ele não tem condições de se assujeitar a este lugar, e ele encarna o Mestre e a tarefa fica submetida a ele. Duas posições muito diferentes, e não fica difícil pensarmos nas conseqüências deste dois posicionamentos para os resultados do trabalho, e para o estilo de funcionamento da equipe.

Quando a Administração suporta o primeiro posicionamento, e a TAREFA, os objetivos, o negócio principal da empresa, passam eles a ser o MESTRE, a indicar os caminhos aos quais também a Administração se sujeita, diz-se que A TAREFA É O MESTRE, e estaremos de conformidade com a possibilidade mais inteligente e produtiva deste discurso.

Conforme isto ocorra, vamos então encontrar os estilos de trabalho mais subordinados à tarefa, ou mais fascinados a um chefe. Em outras palavras, sabe-se que o SINTOMA ocupa o lugar de AGENTE no Discurso e, se acrescentarmos a este fato a constatação de que o líder imprime seu estilo à equipe, vamos encontrar equipes inteiras, "afanisadas" ao sintoma do líder. Como conseqüência, equipes identificadas ao seu chefe e não à tarefa.

Porém, não vamos nos esquecer (generosidade de Freud e de Lacan): é possível trabalhar no sentido da desmontagem dos circuitos imaginários... O limite do "deslouqueamento"? Cada sistema vai indicar, não nos é dado conhecer de antemão.

Este assunto pode ser aprofundado, camada a camada, e ele seria quase interminável, tão intrigante se mostra, e também porque sempre é possível um nível de simbolização a mais sobre os conceitos e sobre os nossos sintomas.