Celepar 35 Anos

A folha, ora... a folha, sempre a folha

Autor: Pedro Luis Kantek Garcia Navarro- GAC




Com a palavra Ana Maria Brotto Parada, valorosa defensora da folha de pagamento em priscas eras.

-- O Diego não era nascido ainda, logo estamos por volta de 1968. Eu era a equipe que cuidava da Folha de Pagamento do Estado, que na época recebia o nome de DDF (Diretoria de Despesa Fixa, que era quem pagava). Lembro-me porque a licença maternidade foi cheia de sobressaltos. Muita mamada teve que ser interrompida pra acudir aqui. Foram 3 folhas mensais que tiveram que ser "arrancadas" da máquina. Aliás, essa gravidez provocou mudanças na equipe. Viu-se que a vulnerabilidade e a dependência a uma só pessoa boa coisa não eram, e logo depois entraram no circuito o Arnaldo e o Janderson, para cuidarem, comigo, do Sistema.

Este não foi o primeiro sistema de pagamento do Estado, antes dele houvera outros 2, mas foi impossível recuperar essa história: seus responsáveis não puderam sequer ser identificados, deve ser coisa do tempo do Herman Hollerith, talvez até do Babbage.

O sistema DDF pagava cerca de 75.000 funcionários e pensionistas, que eram divididos em 5 grupos, e cada grupo recebia o salário em uma data certa. Mais tarde, foram criados os grupos 6 (DER) e 7 (outros órgãos da administração indireta) que foram os últimos a entrarem no sistema.

Os tempos eram outros: o cadastro de pessoas, usava a enormidade de 146 bytes (caracteres) para armazenar todos os dados. Este era um dos MAIORES cadastros que havia, e desses 146 bytes, cerca de 20 eram usados como chaves binárias, guardando-se 160 informações em 20 bytes. Hoje as pessoas reclamam do bug do milênio e acusam os antigos de serem imprevidentes, mas, que imprevidentes que nada: 2 bytes valiam ouro, quem os desperdiçasse estava na rua, e, de qualquer maneira, o século XXI parecia tão distante...

A tecnologia era outra também: o programa de cálculo era atualizado todo mês, e era uma caixa imensa de cartões perfurados. Os cartões que vinham desde o início do programa estavam adequadamente numerados, mas as atualizações mensais sempre eram feitas na undécima hora, na véspera de mandar a fita pro Banestado e, portanto, iam sem numeração mesmo. Vai daí, que no mês de abril de 1971, lá pelo dia 13 ou 14, às 22 horas e 10 minutos, tudo pronto para começar a processar, uma maldita cadeira na sala do computador provocou um tropeção e a caixa do programa saiu voando. Os cartões aterrizaram em uma ordem diferente da que tinham antes: caos total. O que fazer ? O que ocorreu à Ana foi o mais simples: sentar no chão e chorar. Lágrimas pelo nervoso, pela preocupação, pela responsabilidade. Afinal, alguns meses antes, houve um problema de falta de dinheiro para o pagamento, e o pobre computador levou a culpa. A manchete de importante jornal curitibano não deixa dúvidas: "o cérebro eletrônico do Governo atrasa o pagamento". Aliás, que se registre: desde 1968 até hoje, nunca o pagamento atrasou por deficiência de processamento. Os motivos que porventura tenham havido sempre foram outros. Mas, que isso cobrou um bocado de lágrimas da equipe, isso lá cobrou.

O sistema era meio confuso, a entrada era em cartão e a ênfase era o pagamento do mês, embora pela legislação, o histórico financeiro tivesse que ser guardado por 5 anos. Era guardado religiosamente, mas cada vez que tinha que ser consultado, o resultado era meio incerto. Tinha muita coisa manual, que foi sendo corrigida aos poucos. Visto pelos olhos de hoje, era um sistema rudimentar, mas para a época foi um progresso imenso. Naqueles tempos (como hoje) a conta da folha era a maior conta do Governo. Há uma estatística internacional que afirma que a simples implantação de controles formais permite a economia de até 20% dos recursos investidos em folha de pagamento em uma grande organização. Certamente 20% da folha do Estado representam um bocado de economia, e é este valor que o sistema passa a economizar a partir de sua implementação.

Finalmente, em 1975, foi feito um grande levantamento dos problemas existentes e a partir disso, começou o projeto do SIP (Sistema Integrado de Pessoal). Previsto para ser feito em 1,5 anos, levou 3 mais 2 de implantação que só ocorreu completamente em 1979. Portanto, a DDF funcionou valentemente de 1968 a 1980. Quando o SIP foi projetado, o cadastro de pessoas já ocupava mais de 1000 bytes, e os analistas da DDF, subitamente envelhecidos (ia dizer obsoletados: é meio pesado, mas é isso mesmo...) não puderam conter um certo ar de desdém... Também, com toda essa fartura, qualquer um faz um sistema. A propósito, para terminar onde se começou: o Diego hoje tem 26 anos e é, por sua vez, um escovador de bits, dos bons. Aquela história, filho de peixe...