Feira de Informática

Autor: Fernando Leocádio Pianaro

 

 

Há alguns anos, na equipe que era coordenada pelo nosso saudoso Assis, um de nossos colegas, recém-casado, até para sair para o trabalho tinha de pedir licença para a esposinha.

Era um tal de amorzinho prá cá, amorzinho prá lá, dezenas (!) de ligações diárias, algumas de mais de meia hora tentando explicar o inexplicável. A voz da megerazinha já era conhecida, e, no caso da ausência do coleguinha, qualquer um que atendesse o telefone tinha de dar explicações e mais explicações a respeito do paradeiro do mesmo.

Também nesta época, a empresa fretava todos os anos um ônibus para levar o pessoal para a Feira de Informática em São Paulo. E o infeliz comentou que tinha uma vontade enorme de ir mas nem poderia pensar em requerer este privilégio, porque a esposinha jamais permitiria que ele se ausentasse.

Não é que a turma decidiu aprontar com o querido colega?

Pois é... Contando, inclusive, com a ajuda de uma das secretárias da diretoria que providenciou o formulário apropriado, foi preparada uma convocação do pobrezinho para participar da dita Feira por um período que envolvia alguns dias fora de casa. Depois de preparada, foi matreiramente deixada na caixa de correspondência da equipe.

Naquela tarde toda a equipe (exceto o Assis que, ciente da brincadeira, "arrumou" uma reunião e se ausentou) estava aguardando em silêncio a chegada do encilhado. Quando chegou e ainda em pé abriu a correspondência, todos o olhavam de soslaio. Ao verificar o conteúdo, sentou-se (isto é, desabou na cadeira) e ficou totalmente pálido. Todos perceberam, mas ninguém moveu-se um centímentro sequer para não dar nenhum motivo que o levasse a desconfiar de nada. Assim mesmo, o danado ligou para "aquela" secretária que, não só confirmou a convocação, como ainda acrescentou que a confirmação deveria ser feita ainda naquela tarde. Aí é que a coisa ficou boa.

O animalzinho de estimação ligou para a domesticadora e comunicou o fato. Não se sabe o que ela respondeu, mas percebeu-se que ele, lívido, desligou o telefone balbuciando "- Mas, ... mas, ...". Em menos de cinco minutos ela ligou. Depois de uma longa e detalhada explicação do que era uma Feira de Informática, novamente aquele "- Mas, ... mas, ..." e o telefone novamente desligado. Alguns de nós tínhamos de sair da sala para explodir nossas risadas em qualquer outro lugar. Um de nossos colegas encharcou um lenço de tanto chorar de rir. Mas uma "testemunha" sempre estava por ali. Bem, após várias ligações, várias explicações, vários "- Amorzinho, entenda, é só profissional, ...", etc., etc., finalmente a fera liberou. Imediatamente ele confirmou com a secretária.

Agora, imaginem a cena do "alforriado" andando vagarosamente pela sala, com a convocação na mão esquerda, batendo nela com a mão direita, e falando: "- Pois é, este ano reconheceram o meu esforço e me convidaram para a feira... você foi convidado também?"

Diante da resposta negativa ele acrescentava: "- Parece que sou só eu desta equipe, não é mesmo?"

Todos permaneciam sérios, parabenizando o iludido.

Agora imaginem a cena do mesmo ao telefone comunicando a megerazinha de que estava tudo certo, que ela não precisava preocupar-se, etc., etc., agora com uma tonalidade de voz acima da média. Se ele fumasse provavelmente teria ido comprar um charuto para dar mais classe à pose.

E assim foi durante todo o resto da tarde: naquele dia ele não fez mais nada, estava nas nuvens. E pior: a cada 10 minutos a queridinha ligava. Era lindo de se ver!

No final da tarde, o Assis retornou da sua reunião.

Todos se entreolharam, esperando para ver o desfecho, quando o ilustre escolhido comunicou o fato ao chefe.

Na sua infinita bondade, o Assis disse a ele com todo o cuidado do mundo: "- Olha, fulano, eu acho que isto é uma brincadeira dos seus colegas com você ...".Quando ele vermelho de raiva e de vergonha virou-se para nós, a sala veio abaixo com as gargalhadas. Aquele colega que encharcou um lenço dando risadas agora molhou as calças de tanto rir (será que foi castigo, será?).

Depois de ficar literalmente paralisado por alguns minutos (o Assis mais uma vez sumiu!), o pobre coitado ligou para a ferinha e comunicou o fato. Novamente ouviu-se: "- Mas, ... mas, ..." e ele desligou. Foi embora em seguida.

Não sabemos até hoje o que ele explicou em casa, pois nunca mais tocou no assunto.

Pelo menos, ela parou de ligar.