Flagrantes: Procura-se uma Barra Fujona

Autor: Pedro Luis Kantek Garcia Navarro

Vamos começar com uma pequena digressão sobre o windows. Trata-se da maior sacada mercadológica que os anos 80 viram. Não importa o que falem os gurus do marketing, os arautos da sociedade consumista ou os especialistas em mercados globais. O maior vendedor deste fim de século tem nome, sobrenome e ainda por cima um número: Bill Gates III, e ponto final.

Vejamos o porquê: com pelo menos 15 anos de antecedência, o dito cujo anteviu 3 coisas fundamentais. A primeira, é que o microcomputador iria assumir um papel fundamental na computação corporativa (muitos previram que ia se criar um negócio chamado computação pessoal. Mas só ele sacou a sutil passagem do pessoal para o empresarial). O segundo, é que as pessoas precisariam desesperadamente aprender a nova tecnologia. Seus empregos dependeriam disso. E, finalmente — e aqui está a jogada de mestre — o maior obstáculo ao aprendizado dessa nova tecnologia estaria na barreira da linguagem. De fato, computadores e pessoas nunca falaram e nunca falariam a mesma linguagem.

De posse dessa convicção, ele começou a projetar, implementar e divulgar o windows. Eu tive a honra (?) de trabalhar com a versão 1.03 windows. Rodava num 286 com 512 kb de memória e o uso do verbo "rodar" encerra uma baita ironia. Uma vez carregado o windows, o que levava alguns minutos, não sobrava espaço para mais nada. Lembro que só podiamos ver 2 coisas funcionando: o relógio e a calculadora. Recordo até hoje que depois de olhar o programa e matutar a respeito, acabei dando meu verecdito: "quem será que foi o idiota que inventou esse programa maluco, que não serve para absolutamente nada e que ninguém vai comprar?" Bom, eu e ele nascemos no mesmo ano e de lá para cá, dizem as más línguas, que ele juntou cerca de 10.000.000.000 de dólares enquanto eu, se juntei alguma coisa, certamente foi bem menos. Pensando bem, ele não era tão idiota assim.

A genialidade do William foi ter: 1. Percebido um problema no mínimo 10 anos antes que as pessoas comuns se dessem conta de que esse era um problema e bem grande por sinal. 2. Ter trabalhado duro no início, movido apenas por sua visão do mundo que, como os fatos vieram provar depois, era a visão certa, a despeito do que dissessem dele os mais papalvos. 3. Ter o produto certo na hora certa, deixando os concorrentes (que concorrentes ?) a chuparem o dedo.

Enfim, gostemos ou não, a interface implementada pelo windows é a interface padrão dos aplicativos de computador nos anos 90. Fazem parte dessa interface diversas coisas que devem nos soar familiares: os ícones, a barra de comandos e o personagem deste "Flagrantes": a barra de rolagem. Para quem esqueceu, a barra de rolagem é aquele canudo cinza que fica à direita da tela, com uma caixinha dentro e que a gente usa para rolar os arquivos QUANDO ELES OCUPAM MAIS DE UMA TELA. Atente para este detalhe que ele terá a sua importância, já, já.

Há duas semanas, dava eu um curso de HTML e Netscape (sob windows), e os 20 e tantos alunos se divertiam criando e olhando telas. Nisso, uma aluna, exclama irada: o que aconteceu com minha barra de rolagem ? Todos a têm e eu não..., quero a minha barra..... Chamado a ver o que ocorria, tive meus 5 minutos diários de bobeira, e comecei a procurar dentro do comando OPTIONS do Netscape, como eu poderia desenhar de novo a tal da barra de rolagem desaparecida. Obvia-mente, não consegui nada. Perguntei para o monitor que me ajudava se ele sabia o que fazer. Não sabia. Cadê o manual do windows ? Não tem manual. Chama o help do Netscape. Nada por aí também. Ligo para o Tarso aqui na Celepar. Explico o problema, o Tarso diz: hmmmmm. Mas também não sabe o que é. Finalmente, apelo para nossa enciclopédia ambulante: o Furquim. Estou ainda no início da descrição do problema ("sumiu a barra de rolamento, não conseguimos encontrá-la") quando ele, levemente irônico, me interrompe:

— Por acaso o que você está mostrando ocupa mais do que uma tela ?

Antes que ele terminasse a pergunta eu me dei conta do tamanho da burrice que nos acometera. Ora, a barra só aparece quando a tela a mostrar ocupa mais do que a área do monitor. E a aluna em questão depois de digitar por mais de meia hora, só tinha preenchido umas 5 ou 6 linhas. Qualquer criança de pré-escola sabe que nesses casos a maldita barra não é desenhada. Enquanto o Furquim falava, imediatamente comecei a pensar numa desculpa aceitável para essa pisada no tomate. O pior foi escutar o comentário dele. Após ouvir educadamente minhas esfarrapadas desculpas, assumiu um ar levemente superior, pude até vê-lo pelo telefone, e fulminou: "não se apoquente, isso acontece nas melhores famílias..."