Flagrantes: Três rapazes espertos no Rio (ou , eu não sou gato de Ipanema...)

Autor: Maurício Stunitz Cruz - GAC

Este episódio aconteceu naquele tempo em que a CELEPAR fretava ônibus para levar o pessoal técnico aos grandes eventos de informática.

Os heróis desta aventura eram três programadores com pouco tempo de casa, mas cheios do entusiasmo e da confiança próprios aos jovens. Vamos chamá-los de Tico, Teco e BR (alguns mais antigos na casa devem saber quem são).

A história aconteceu em uma viagem ao Rio de Janeiro. Era uma daquelas megafeiras (para a época) que aconteciam no centro de exposições do Riocentro. Feira visitada, programação cumprida, só restava voltar para a terra dos pinheirais. Como a comitiva tinha que sair do hotel antes do meio-dia, ainda sobrava uma tarde na Cidade Maravilhosa e a maioria queria aproveitar a oportunidade para um passeio. Depois de muita discussão, idas e vindas, decidiu-se por uma visita ao Cristo Redentor. Ela lá se foi a exc..., a comitiva.

Seguindo as placas, o brioso motorista levou o ônibus com os celeparianos ao caminho para o Morro do Corcovado, que passa pelo bairro do Cosme Velho. Belíssimo, com mansões antigas, o bairro tem ruas muito estreitas e... chegou um momento, o ônibus entalou e não conseguia mais subir. Por "sorte", no local deste deadlock (me perdoem os não informáticos), estavam simpáticos motoristas de táxi oferecendo-se para levar os religiosos celeparianos a visitar a imagem do Cristo, mediante o pagamento de uma extorsiva taxa individual.

Nossos heróis (finalmente eles aparecem) resolveram não ir. Não que não fossem religiosos, mas, simplesmente, já conheciam a atração. Sentaram em um bar próximo, tomaram uma cervejinha, outra, mais uma. Passou um tempo e...

- Pô, o pessoal está demorando, diz o Tico.

- E vão demorar um monte ainda, diz o Teco.

- Vamos dar um passeio, olhar o bairro, propõe o BR.

Proposta aceita, lá se foram os três. E começam a descer por uma rua, viram numa outra, passam pela estação do Bonde do Corcovado, andam mais um pouco. Sempre descendo, caminharam quase meia hora.

- Pô, acho que está na hora da gente voltar, diz o Tico.

- É, a gente já andou um monte, diz o Teco.

- Então vamos voltar, diz o BR.

Só então se deram conta do quanto teriam de andar (subir) de volta.

- Pô, é só subida, diz o Tico.

- É, vamos ter que subir o tempo todo, diz o Teco.

- Vamos lá pessoal, que é perto, diz o BR.

E lá se foram nossos heróis, subindo as ladeiras do Cosme Velho. Ao chegarem a uma bifurcação surgiu uma certa divergência e, depois de alguma confabulação, concluíram que estavam perdidos.

Neste instante, o BR, com sua vocação para líder, faz o diagnóstico:

- Eu acho que é atrás deste morro.

Para Tico e Teco o morro parecia o Himalaia.

- Nós vamos ter que dar uma volta enorme para contornar este morro, diz o Tico.

- Tomara que o pessoal não tenha ainda chegado, senão vai ser uma gozação só, diz o Teco preocupado com sua reputação cosmopolita.

- Vamos cortar caminho por aquela escada ali, diz o BR.

A escada em questão era uma escadaria enorme, com centenas (para a dupla Tico e Teco pareciam milhares) de degraus. Mas o entusiasmado BR os animou:

- Com certeza é só a gente subir pela escada, descer do outro lado, que nós chegaremos ao local onde está estacionado o ônibus.

Diante de tamanha confiança, os outros dois concordaram. A preocupação já não era o cansaço, mas a gozação que os esperaria caso atrasassem a viagem. E trataram de subir.

Lá pelo degrau 493, confiança diminuindo, encontraram uma senhora descendo e perguntaram a ela se o caminho estava correto. A mulher olhou-os com uma expressão (algo assim como: pobres coitados!) que deixou Tico e Teco um pouco perturbados. Mas já tinham subido tanto, o líder ainda conservava o entusiasmo, portanto, continuaram.

Degrau 723. Encontraram um homem e pediram informações. O homem disse para eles subirem que tinha uma saída do outro lado e, em seguida, virou-se para cima e fez alguns sinais. Qualquer pessoa sensata teria voltado dali, mas aos nossos heróis parecia que os aproximadamente duzentos degraus restantes poderiam ser vencidos.

Finalmente, chegando ao final da escada, deram de cara com uma favela (claro!).

- Vamos voltar, diz Tico.

- É, acho melhor nós voltarmos, diz Teco.

- Que nada! Olha, é só descer por ali (uma viela tortuosa) que já começa a descida, falou vocês já sabem quem.

É inacreditável, mas é verdade! Nossos heróis (que possuem o biótipo típico dos habitantes do Sul do país) entraram na favela. Atravessaram a viela e deram em uma espécie de praça, com um campo de futebol. Quando entraram na praça o jogo parou. Vinte e tantas pessoas (com o biótipo típico dos moradores de favelas do Rio) ficaram olhando para eles.

Há controvérsias sobre quem deu o comando de retirada. Só há a certeza de que foi atendido imediatamente. Nossos heróis desceram a escadaria pulando degraus de cinco em cinco e ao chegarem na rua correram no mais corajoso estilo "Salve-se quem puder".

Por sorte (deles) quando chegaram ao ônibus, o pessoal do passeio ainda não havia voltado e com isso as reputações foram salvas.