Flagrantes: Um analista esperto

Autor: Pedro Luis Kantek Garcia Navarro- GAC

Temos colega que veio para Curitiba atraído pela qualidade de vida que a cidade ostenta. Veio de longe, estava em férias, passou e passeou por aqui e logo depois arrumou emprego, transferiu a escola dos filhos e um belo dia, pronto: mais um curitibano de adoção entre nós.

Morou anos em casa alugada, enquanto se decidia sobre onde e como morar. As alternativas eram várias, desde apartamentos aqui por perto do Centro Cívico ou casas com quintal e jardim, estas naturalmente mais longe. Um belo dia, passeando nas redondezas do aeroporto encantou-se com uma pequena chacrinha. Não era só um quintal, era um senhor quintal, com árvores frutíferas, galinheiro, espaço para cachorros, papagaios e gatos, não era só um jardim, era quase um paraíso terrestre.

 

Problema, só tinha um: a distância. Bem nessa época, tinha sido aberta a Avenida das Torres, uma enorme serpente de asfalto que liga essa região, passando pelo maior viaduto de Curitiba sobre uma parte boa do centro ao centro, desembocando aqui ao lado da CELEPAR.

 

Estava decidido: chácara grande, lugar com conforto, longe de tudo, mas a 10 minutos do centro do cidade. Já se percebeu que este colega era (e é) pé de chumbo: enquanto a Torres era meio deserta, para ele era uma pista de corrida.

Os anos foram passando, a cidade foi se encorpando ao longo da avenida, os grandes mercados foram se instalando e o que era uma pista expressa, passou a ser uma rua comum, cheia de sinaleiros e lombadas. A tudo isso nosso personagem resistiu sem fazer muito caso: nas horas em que ele passava a cidade ainda estava meio deserta e dava para continuar correndo.

O problema surgiu no dia em que a prefeitura instalou as lombadas eletrônicas. Antecessoras dos atuais pardais, as lombadas eram impressionantes: um pórtico cheio de luzes, sinais e sons, que abrangia as 3 pistas da avenida, especialmente estreitada no ponto, não havia como fugir deles. Nosso personagem se desesperou, considerou aquilo uma ofensa pessoal, aquela era a avenida "dele", como a prefeitura podia fazer isso?

Deu tratos à bola, ganhou (e pagou) várias multas, ainda antes de novo código de trânsito, quando as multas eram mais baratas e não havia essa história de pontos na carteira. Tanto deu à bola tratos, que um dia, eureka!, fêz-se a luz: uma brilhante idéia salvadora. Ao ver uma moto passando no pórtico em alta velocidade, ele conjecturou, muito a propósito que apenas as 2 rodas eram incapazes de acionar o mecanismo. Experimentou uma noite, passar com as rodas da direita em uma pista e com as da esquerda na outra. Beleza, pensou, o mecanismo não apitou nem reclamou: estava feita a descoberta. Como ele ia bem cedo, com a estrada vazia, podia dividir o carro em 2 e passar em alta velocidade sem nenhum problema.

Muito contente, achando que nunca mais ia receber multa, um susto levou no dia em que recebeu 2 correspondências do Detran. Com todas as pulgas atrás da orelha abriu as cartas. Os leitores mais espertos já devem ter sacado o que veio: não era uma multa, eram DUAS multas, uma para cada pista. E durante vários dias a dupla chegou pontual: o caixa do banco nunca conseguiu entender como aquele sujeito era sempre o mesmo, sempre no mesmo horário, sempre no mesmo local e sempre de duas em duas multas. Não dava para entender mesmo.

E assim, encerra-se esta história do analista esperto.