O patê assassino

Autor: Pedro Luis Kantek Garcia Navarro

 

Acostumado a, mensalmente, contar histórias de desgraças que acompanham nossos colegas e amigos na aventura que é o nosso viver, neste mês temos uma exceção e conto causo que aconteceu ontem e no qual fui eu um dos involuntários participantes. E, por isso, abro mão da já tradicional reserva na citação dos personagens. Assim, com nome e sobrenome dos envolvidos, aqui vai o incrível caso do patê assassino.

Como sabem os que nos conhecem, aqui na GAC, temos por costume um tradicional lanchinho lá pelas 17h00. Ontem, talvez por conta dos próximos festejos natalinos, a mesa era farta e convidativa. Visitava-nos a Maria Alexandra toda elegante no seu terninho de microfibra. Depois, no rescaldo da tragédia, vim a saber que o mesmo recém havia saído da lavanderia. Bem se diz por aí, que desgraça pouca é bobagem.

Convidada a um café, não se fêz de rogada e fomos ambos para o balcão das comidinhas. Tínhamos passas, avelãs, torradas, queijos e um belo patê de fígado. Ontem foi um dia abrasador de quente e o patê normalmente rígido na embalagem, estava mole feito água numa bisnaga de carnaval, mas é claro, nesse instante nem eu nem ela sabíamos do fato.

Encasquetei de preparar uma crocante torrada devidamente besuntada com o dito cujo. Aqui na GAC, desenvolveu-se uma estratégia para passar o patê sem sujar facas ou garfos: trata-se de fazer pequeno furo na embalagem e apertá-la como se fosse um tubo de confeiteiro. Sempre funcionou às mil maravilhas, é tiro e queda.

Ao apertar a bisnaga, a mesma recusou-se a expelir o seu conteúdo. Pensei que a ponta devia ter coagulado e que um ligeiro aumento de força era necessário. Apertei mais. De novo, a bisnaga se fêz de rogada. Foi hora de aplicar a força que se nome tivesse poderia ser "quem esse patê pensa que é ?".

Enquanto isso, a Alexandra com seu terninho de cor creme, toda calma e sossegada servia-se de café e passava uma humilde manteiguinha na torrada. Se eu tivesse mirado não teria feito melhor tiro. A força aplicada na bisnaga foi mais do que suficiente para desentupir a ponta. E também mais do que suficiente para lançar um jato, jorro, gorgolhão, golfada ou que nome se lho queira dar, de um patê subitamente liquefeito sobre a pobre Maria Alexandra.

O terninho, aquele recém retirado da lavanderia, aquele de reluzente microfibra, jazia, ao instante, soterrado por várias camadas de patê artisticamente entrelaçadas. Eu não sabia se pedia desculpas ou se explodia de rir. Acho que fiz ambas as coisas. E depois, mais que rápido saí de perto. Trabalhando com a Alexandra há mais de 10 anos, não sei o que é melhor e mais admirável nela: se a capacidade de trabalho e de realização, sempre amplas e crescentes, ou se a capacidade de enfurecimento e indignação, também amplas e estas sim, sempre crescentes.

Preciso deixar amainar a fúria para voltar a falar com ela sobre o episódio. Enquanto isso, cuidado com os patês assassinos de terninhos de microfibra. Como disse lá em cima, são tiro e queda.