Qualidade

Autor: Extraído da apostila do IBQN

Estamos, na Celepar, dispendendo esforços na implantação do nosso programa de qualidade total. Em qualquer livraria a gente tropeça em dezenas de livros sobre o assunto, e na televisão, jornais e revistas percebemos a ênfase que as empresas estão dando aos seus "programas de qualidade". Mas afinal, o que é um programa da qualidade total? Qual a diferença desta "qualidade" daquela que conhecíamos antigamente? O que significam expressões como controle estatístico da qualidade, controle de qualidade, garantia de qualidade?

Para nos ajudar a esclarecer estas e outras dúvidas sobre o assunto, o Bate Byte estará nas próximas edições publicando uma série de artigos sobre Qualidade, a partir de uma lista bibliográfica, textos e apostilas disponibilizados pelo IBQN e pela nossa biblioteca (lista esta que está sendo publicada nas próximas páginas). Vamos começar este mês com um pouco sobre história da qualidade, com um histórico da evolução de tecnologia e qualidade.

Qualidade é uma preocupação recente na produção de mercadorias? Certamente que não, mas nos diferentes estágios pré-industriais e industriais, o termo qualidade adquiriu dimensões diversas.

Na era dos artesãos, a qualidade de um produto constituía quase que uma marca de fábrica: eram as "Espadas de Toledo", os "Violino Stradivarius", e outros produtos afamados da antiguidade representavam, pela sua marca,uma garantia de qualidade do produto. A razão era simples: o artesão executava todas as fases da fabricação, até o produto acabado. Este representava um padrão de qualidade ou, em alguns casos, uma obra-prima que orgulhava a quem o havia fabricado ou produzido.

O advento da Revolução Industrial provocou, no entanto, uma profunda transformação nas técnicas da produção. A multipartição da produção em pequenas tarefas e a necessidade da intercambialidade das peças estabeleceram as bases da produção em massa.

Todavia, com a Revolução Industrial, os artífices foram se afastando mais e mais do "produto final", e à medida que esse afastamento aumentava - e aumentava a subdivisão de tarefas - mais difícil se tomava controlar a qualidade desse "produto final" porque:

a) Não havia a "motivação" do artíficie para a apresentação de um produto do qual, regra geral, não tomava ele conhecimento, quando acabado;

b) A interferência, na produção, de mais de uma pessoa, despersonalizava o produto, desligando-o, automaticamente, dos artífices que o haviam produzido;

c) A diferença de "acuidade", "habilidade" e "zelo profissional" entre dois ou mais artífices, que tomavam parte da fabricação do produto, complicava até mesmo a montagem final, dadas as discrepâncias pessoais nos requisitos assinalados.

As questões da "qualidade industrial" foram se avolumando a ponto de exigirem uma série de medidas cada vez mais restritivas sobre a produção, como:

a) Especificações mínimas dos materiais a empregar;

b) Análise das matérias-primas empregadas;

c) Calibração de equipamentos de medida e aferição com padrões reconhecidos e estabelecimento oficial destes padrões;

d) Acompanhamento dos processos de fabricação;

e) Ensaios e testes - ao longo da fabricação e finais (performance).

Isso, entretanto, não representou tudo, a ponto de, durante a denominada "Primeira Guerra Mundial", haver sido estabelecido um dispendioso "Controle de Qualidade" com a análise de 100% das peças que compunham cada equipamento ou sistema. Essa política, entretanto, não podia ser estabelecida como rotina, pelos altos custos que provocava, surgindo daí o denominado "Controle Estatístico da Qualidade".

O "Controle Estatístico da Qualidade", baseado fundamentalmente na probabilidade dos eventos, foi sendo aperfeiçoado gradualmente. Teve seu desenvolvimento e maior aplicação ao longo da "Segunda Guerra Mundial". Foi ele, nessa fase, exercido com a maior intensidade, até que se atingiu - ainda antes do término da guerra - a era dos "mísseis balísticos" e das "ogivas nucleares". Neste ponto, só "Controle da Qualidade" tornou-se insuficiente, porque:

a) A segurança envolvida representava o ponto crítico da qualidade do produto final;

b) Os riscos envolvidos, por outro lado, eram imensos, enfatizando o problema;

c) Os materiais até então conhecidos não apresentavam suficientes propriedades para as diversas novas funções;

d) Novos materiais foram estudados, mas não se conhecia o seu comportamento sob condições árduas de serviço, isto é, não havia suficientes dados sobre eles e seu comportamento, ao longo do tempo;

e) Também, era necessário se testar e ensaiar todas as fases de fabricação e o desempenho dos artefatos, após fabricados;

f) Ademais, quer por medidas de segurança permanente quer por necessidade de um "controle retroativo", era uma imposição técnica a existência de dados sobre o "histórico" de cada material, de cada projeto, de cada processo de fabricação, a fim de que, no caso de falhas detectadas, fosse possível se retroagir às fontes de origem - quer dos materiais, quer dos projetos, quer dos desenhos e processos de fabricação - de maneira a impedir a ocorrência de acidentes, no caso de artefatos já fabricados, ou prevenir a repetição dessas falhas.

Foi desse contexto que, realmente, surgiu a denominada "Garantia da Qualidade", segundo a nova filosofia da Qualidade modernamente empregada na indústria. A "Garantia da Qualidade" surgiu, pois, da necessidade de se obter níveis de qualidade quase que absolutos (o "absoluto" aqui, aplicado no caso de "possível" segundo todos os meios de que a moderna tecnologia dispõe). Para isso, os programas de projeto e construção de submarinos nucleares, mísseis balísticos e espaçonaves contribuíram sensivelmente para a formulação de programas sofisticados de "Garantia da Qualidade", os quais, mais tarde, foram em grande parte extrapolados para a tecnologia nuclear, e hoje em dia, já estão adaptados à tecnologia convencional.

Entretanto, apesar de todos esses cuidados, não se evitou que vários acidentes ocorressem, alguns mesmos fatais. O mais impressionante deles - dos que foram divulgados, obviamente - foi o acidente ocorrido com a cápsula "Apollo" em que foram vítimas Gruissom, White e Schaffe, em 27 de janeiro de 1967.

Em 1971, outro acidente relacionado com a "Garantia da Qualidade" ocorreu. A General Eletric, pelo fato de "registrar" todos os dados referentes à fabricação de equipamentos de alta precisão e qualidade, conseguiu "detectar" uma falha em "Pacemaker" (marca-passo) para cardíacos e por "rastreamento" (traceability) extrapolou as falhas de 20 desses "Pacemakers" a todos aqueles que se referiam à mesma linha de fabricação, num total de 487, publicando na imprensa uma "chamada de interessados".

Esses exemplos mostram como um "Programa de Garantia de Qualidade" bem estruturado e cumprido adequadamente pode evitar uma série de contratempos e acidentes. E a moderna sistemática da qualidade, se aplicada segundo seus preceitos, não é mais onerosa; ao contrário é mais econômico - e mesmo mais inteligente - prevenir do que corrigir a posteriori, com perdas de mão-de-obra, materiais etc. e - na maioria das vezes - conceito, ou, em outras palavras, prejudicando a imagem da empresa.

Os princípios da "Garantia de Qualidade" existem para reduzir - se possível eliminar - a ocorrência de eventos como os acima, inaceitáveis na época presente. Mas "Garantia de Qualidade" nada mais é do que uma boa prática gerencial e administrativa, que aplicada adequadamente e dentro do bom senso nada custará; ao contrário, economizará tempo e dinheiro, aumentando os níveis de segurança de confiabilidade e de eficiência.

Por outro lado, "Garantia de Qualidade" praticada inadequadamente, pode se tornar onerosa, não somente por falhar no cumprimento de seus objetivos positivos, mas também, ocasionando restrições negativas e desnecessárias e aborrecimentos no desenvolvimento dos trabalhos de fabricação. Se aceitarmos que a garantia da Qualidade se dilua em simples exercícios ou trafas de "papéis escritos" inconseqüentes, então nada será feito e nada resultará a não ser um "monte de papéis inúteis"... e dispendiosos.