Quem disse que não há pimentões em novembro?

Autor: Pedro Luis Kantek Garcia Navarro

 

Antes de prosseguir, uma explicação: os pimentões de que fala o título são aqueles vermelhões, rubros, berrantes, sanguinários até.

Vamos para nossa história. O cenário: Conferência Internacional de Software Livre, no centro de Treinamento da Brasil Telecom em Curitiba. Cerca de 1500 participantes, pelo menos 6 palestras ocorrendo em paralelo, feira, eventos, convidados internacionais, motoristas perdidos, uma que outra autoridade, ministro chegando, comes e bebes, tudo rolando nos trinques.

Não sei se o prezado leitor sabe, mas organizar um evento nesses moldes dá um trabalhão danado. A quantidade de coisas que podem dar errado é imensa, e existe aquele célebre pensador, creio que se chama Murphy, que não deixa ninguém dormir sossegado.

A equipe organizadora está de parabéns. Alguns diriam que milagrosamente deu tudo certo. Outros, mais descrentes, mandariam uma banana para o milagre, diriam que deu tudo certo porque a turma que arregaça as mangas trabalhou 26 horas por dia. Salomonicamente, fiquemos com as duas explicações, ambas devem ter um fundo de verdade.

Nossa colega Elaine estava de plantão durante todo o evento. Aparentemente ela decidira, como coisa pessoal, que nada daria errado. E, portanto, nada daria errado. Caso encerrado.

Um dos palestrantes, era um tal Timothy Ney, que todos sabemos ser um bacana no mundo do software livre, conhecido e reconhecido em qualquer evento internacional desse tema. O problema é que só o conhecemos pelos seus escritos, estes sempre sérios e comportados, como se poderia esperar de um cientista importante.

No dia da palestra dele, o presidente da mesa o chamou e começou o que aqui chamarei de “a performance”. Imagine, prezado leitor, o Mr Bean, aquele inglês metido a sonso da televisão. O conferencista era pior. Chamado, ele começou a se fazer de manhoso e a andar aos trambolhões, como se perdido estivesse. Sem perceber nada (ninguém ainda tinha sacado a performance) a nossa Elaine mais do que rápido se dirigiu ao sujeito para guiá-lo até a mesa. Essa providência era necessária, o lugar estava cheio, e o sujeito realmente parecia perdido.

Quando a Elaine chegou perto dele, foi logo informando: “Ai donti espeki inglish”, mas o que o bacana tinha em mente era pura mímica, prescindia do idioma, e ele sorriu por dentro: aqui estava a sua vítima. A Elaine agarrou o sujeito pelo braço para levá-lo. Foi o que bastou para ele começar a se recusar a andar. A situação ficou assim: a Elaine puxando o gringo e ele se recusando a andar. No começo a platéia (e a Elaine) levaram um susto. Aos poucos, a gaiatice foi percebida e um sorriso começou a aflorar em todos. Todos não: o Timothy era a seriedade em pessoa, e a Elaine tinha acabado de perceber em que mico recém entrara.

Aos trancos e barrancos (neste caso literalmente falando) algo simples como conduzir uma pessoa até uma mesa estava se desenrolando cheio de sobressaltos e dificuldades. Já próximo ao final, ao ver uma cadeira vazia, o Mr Bean abriu os braços, soltou o ar com arrufos e sentou-se resolutamente nela, olhando desafiadoramente, daqui não saio, daqui ninguém me tira, para a Elaine.

Ela é valente e valorosa, mas o rosto e o pescoço pintaram-se de vermelho. Eis a razão do pimentão no título. Que sufoco. Como a coisa terminou: quando finalmente ele começou a falar, era a seriedade em pessoa. Parecia um varão de Plutarco, deu uma palestra e tanto. Sobre a performance, nenhum comentário, era desnecessário. Foi aplaudidíssimo.