Terceiro setor, nem público, nem privado

Autor: Maurício Stunitz Cruz - GPA


A possibilidade de uma via alternativa entre público e privado, e por extensão entre Estado e mercado, hoje é real e se materializa no chamado terceiro setor da sociedade. Você quer saber mais um pouco sobre o que é terceiro setor?

Em artigo publicado no BateByte n0 36 demonstrou-se de maneira rápida e sucinta a evolução dos conceitos de público e privado e, também, como se deram as relações políticas, econômicas e sociais entre estas duas esferas de atuação do ser humano.

A relação público-privado foi tratada a princípio como complementar, porém na conclusão do artigo foi salientado que diante da complexidade do mundo atual, a atuação dos agentes públicos e privados já não atende de maneira satisfatória às demandas da sociedade moderna. Essa situação fez com que surgisse um interregno na relação tratada anteriormente como complementar.

Seja pela impossibilidade (financeira, administrativa e/ou operacional) do Estado suprir às solicitações que, em tese, estão sob sua responsabilidade, seja pelo desinteresse, sobretudo econômico, do setor privado em' assumir a responsabilidade sobre a produção de bens e serviços de interesse da coletividade, o fato é que existem atividades e setores produtivos que não são entendidos corno de competência específica nem do Estado, nem da iniciativa privada.

0 impasse surgido dessa situação tem sido tratado de duas maneiras bastante distintas. A primeira, ainda dentro do contexto público privado, tem se dado através de iniciativas que buscam a cooperação entre o Setor Público e a iniciativa privada. Como exemplo dessa linha de atuação temos as parcerias.

A segunda direção não representa propriamente uma solução para o impasse (do ponto de vista da dicotomia público- privado), mas sim uma nova proposta nas relações entre os diversos agentes da sociedade e que depende basicamente da atuação da sociedade civil. Cabe destacar que a sociedade civil no contexto deste artigo não pertence nem à esfera do público, nem à esfera do privado; mas ocupa o vácuo criado pela não atuação, ou pela atuação deficiente, dos agentes tradicionais. Trata-se das associações de classe, dos sindicatos, das associações de natureza espacial ou ocupacional, entidades de representação sem fins lucrativos, e finalmente das famosas e misteriosas organizações não governamentais, as ONG's (você pode pronunciar separado 0, N, G. OU então como se fosse uma palavra : "ongue"; o que na minha opinião fará com que você emita um som horroroso, digno de um homem (ou mulher) das cavernas).

As entidades acima descritas têm sido referidas como pertencentes ao terceiro setor. Para Rubem César Fernandes, coordenador do Movimento Viva Rio, o terceiro setor, apesar de "não governamental, não lucrativo é, no entanto, organizado, independente, complexo e mutante; mobiliza os recursos e os vínculos de solidariedade que dão sentido plural e ativo à cidadania. Sua emergência implica mudanças gerais nos modos de agir e de pensar as relações entre Estado e mercado". Com o surgimento do terceiro setor foi revertida a tendência de tratar a res publica (a coisa pública) como propriedade e responsabilidade única e exclusiva do Estado.

A princípio as entidades que compunham o que atualmente se chama terceiro setor tinham objetivos assistencialistas e eram, em sua maioria, vinculadas a algum movimento religioso. A ampliação do conceito e da abrangência de sua atuação veio a partir dos obstáculos criados pelo regime militar para o exercício da cidadania, durante a década de 70. Novas organizações procuravam atuar de maneira independente do governo, deixando de lado a atuação assistencialista tradicional, e passando a tomar uma atitude reivindicatória perante as autoridades públicas. Fernandes nota que "as ONG's tornaram-se centros de recursos humanos (assessorias, informações, materiais pedagógicos, formação, elaboração de projetos, etc), postos de serviço das associações comunitárias e dos movimentos sociais. Criou-se, desta forma, um circuito não-governamental de cooperação capaz de articular iniciativas tomadas nos mais diversos planos da sociedade civil".

0 que move as iniciativas ligadas ao Terceiro Setor é o desejo de criar alternativas às questões que são tratadas de maneira pouco eficiente pelo Estado e que não são objeto de atuação da iniciativa privada. Os objetivos a serem atingidos são os mais diversos. Desde as reivindicações pela melhoria da assistência médica de um bairro, até grupos ecológicos com escala mundial, passando por atividades de apoio à administração de pequenos municípios e prole tos educacionais.

A questão chave que permeia este movimento é a construção de um novo conceito de espaço público que possibilite a criação de condições para a retomada do exercício da cidadania, dentro das potencialidades e complexidades do mundo contemporâneo.

A ação do Terceiro Setor não deve se limitar à fiscalização das atividades do governo. Deve buscar, acima de tudo, ocupar o espaço não preenchido pelo mercado e pelo Estado na atuação social. E isso requer a participação da sociedade civil.

Mas nessa altura você pode estar se perguntando : mas o que tudo isso tem a ver com informática Pública ou com a CELEPAR ? Ou ainda, mas o que é que tem a ver comigo?

Do ponto de vista da Informática Pública, a construção de um novo conceito de espaço público, onde a comunidade possa atuar de maneira não tradicional, porém efetiva, na solução das questões que lhe interessam, passa, sem dúvida, pela disponibilização da base de informação pública à sociedade e pela transparência na atuação do Estado. Ora, estes dois itens, mais a eficiência da máquina administrativa estadual, são a CELEPAR do futuro!

E se você é uma daquelas pessoas que fica perplexa face à falência das ideologias e das dificuldades em participar de maneira ativa e positiva na sociedade, o Terceiro Setor pode ser uma alternativa para as suas inquietações. As possibilidades de atuação nessa área vão desde a participação voluntária e informal, até ao trabalho profissão mal remunerado. Ou então olhe pela janela de casa ou do carro e, mãos à obra, crie a sua própria ONG!

Referências Bibliográficas

BERNARDES, Ernesto & NANNE, Kaíke. 0 Brasil organizado funciona. Veja, v.27, n. 6, São Paulo, 1994.

FERNANDES, Rubem César. Privado porém público: o terceiro setor na América Latina : Rio de janeiro. Relume Dumará, 1994.