XXI Seminário Nacional de Informática Pública:

Autor: Cristina Ângela Filipak Machado, Luiz Carlos de A. Oliveirae Paulo Alcion de Oliveira

1 Objetivo

Relatar a experiência da Celepar - Companhia de Informática do Paraná, adquirida com o processo de terceirização do desenvolvimento e manutenção de software, levantando os pontos a serem considerados quando do estabelecimento do processo, as dificuldades e os benefícios encontrados.

2 Introdução

A questão de terceirização nas atividades de desenvolvimento e manutenção de software no âmbito do setor público tem ensejado diversas discussões que estão fortemente associadas a alguns aspectos, entre os quais destacam-se o papel e posicionamento do setor público neste segmento, especialmente no que tange às empresas públicas de informática e aos técnicos de informática dessas empresas. Esta questão merece uma análise sob diversos prismas. Por um lado, devem ser discutidos os papéis dos diversos agentes envolvidos e, por outro, as questões técnica e gerencial relacionadas com a própria possibilidade de implementação e prática de um processo de terceirização. Toda esta análise e discussão deve ser balizada na busca de uma melhor forma de atendimento às necessidades dos nossos clientes. É neste contexto que apresentamos este trabalho que busca relatar o entendimento e a experiência da Celepar – Companhia de Informática do Paraná na implementação de uma prática de terceirização nos serviços de desenvolvimento e manutenção de sistemas.

Neste artigo, a seção 3 descreve o cenário que envolve a terceirização; a seção 4 descreve fatores relevantes a serem considerados para o estabelecimento do processo; a seção 5 descreve a experiência da Celepar, juntamente com as dificuldades e os benefícios encontrados no processo; a seção 6 apresenta resultados alcançados e a seção 7 contém a conclusão do artigo.

3 Cenário que envolve a terceirização

A discussão de um processo de terceirização de atividades de desenvolvimento e manutenção de software não pode se dar de forma isolada no âmbito da administração pública. Esta questão está inserida num contexto maior e está aliada a uma tendência mundial de redefinição das atividades do setor público. Existe uma tendência dos setores públicos terem seu foco de atuação em atividades vitais à população como: educação, saúde, transporte,... e para os segmentos que pudessem ser substituídos pela iniciativa privada, assim o seriam. Levando-se isto em conta, as empresas de informática, cujos serviços são essenciais para o desempenho de qualquer segmento que o Estado venha a adotar como prioritário, precisam refletir sobre os seguintes aspectos:

Demanda crescente por serviços:

Podemos observar que o setor público passa por uma crescente demanda por serviços de desenvolvimento de sistemas de informações. A necessidade de competitividade e de melhoria de imagem do serviço público, associada à disponibilidade cada vez maior de recursos computacionais (redes, micros,

ambientes departamentais), têm levado a uma significativa demanda por soluções. Este fator, aliado à "popularização" da informática, onde a utilização de equipamentos pessoais tem aumentado muito nos últimos anos, possibilita que o cidadão, o funcionário público, a equipe de gestão de governo, tenham, a cada dia, mais contato com a informática, independentemente se este contato foi provocado pelo Estado ou individualmente. Isto faz com que muitas sejam as referências e relações que o consumidor/cidadão passa a estabelecer. Se a automação dos serviços bancários, por exemplo, trouxe ao cidadão uma melhoria significativa, por que serviços como a arrecadação, solicitação de carteira de motorista, ou consulta às informações de governo não podem ser feitas e facilitadas através do computador?

Dificuldade/impossibilidade de aumento do quadro funcional na mesma proporção da demanda:

Outro fator a ser considerado é a impossibilidade de aumento do quadro de funcionários ligados a desenvolvimento de aplicativos/sistemas na mesma proporção que as demandas. Um aumento desta natureza é absolutamente incompatível com o modelo de gestão pública que vem sendo discutido nos últimos tempos. Tornaria as empresas ou os setores de desenvolvimento estruturas "pesadas", com dificuldade de mobilização, mudanças e adaptações requeridas.

Fornecedores buscando oportunidade de negócio junto aos órgãos públicos:

Conseqüência da mudança da atuação do Estado, do grande mercado que representa o setor público, e da área de software ser uns dos mercados que mais movimentam dinheiro no mundo. Os fornecedores de software viram no Estado uma oportunidade de negócio, a exemplo do que ocorre com outros setores. Isto o torna um setor bastante visado pelas empresas de desenvolvimento de software da iniciativa privada. As empresas públicas de informática, ou setor de informática de empresas públicas de outros segmentos, devem levar em conta esta variável na definição do seu modelo de atuação. Este fator deve ser considerado como uma boa oportunidade de parceria e atendimento às demandas, e não como uma ameaça à atuação das empresas públicas.

Necessidade de agilidade e qualidade nas respostas:

Como conseqüência de um maior esclarecimento do nosso cliente (funcionário público, cidadão, equipe de gestão do governo,...) e da dependência cada vez maior dos processos produtivos do Estado em relação à informática, hoje existe, cada vez mais, a exigência por qualidade e rapidez nas respostas em relação a estas soluções. Muitas dessas cobranças vêm através de um comparativo com o mercado e da própria pressão do mercado de informática sobre os clientes.

Múltiplas tecnologias:

A existência de múltiplas tecnologias no mercado, vinculadas a necessidades e soluções das mais diversas, faz com que seja necessária uma agilidade no domínio e na utilização destas tecnologias. É cada vez mais comum soluções que envolvem múltiplas plataformas tecnológicas, que vão desde o tradicional "mainframe" às novas arquiteturas distribuídas com componentes sendo disponibilizados via Internet e outras plataformas. Esta questão gera uma dificuldade técnica, que é dominar completamente todos os componentes existentes para desenvolver uma solução informatizada, onde a especialização está sendo cada vez mais necessária. Este fator, aliado à dificuldade de mão-de-obra, faz com que exista a necessidade de se recorrer ao mercado, tanto para assimilar tecnologias não dominadas como para executar serviços dentro destas tecnologias.

Demanda inconstante:

Uma última variável que deve ser levada em conta no quadro onde está inserida a questão da informática pública é a questão da inconstância nas demandas. Sabe-se que, algumas vezes, estas estão vinculadas diretamente às ações e planos de governo, que possuem um ciclo próprio ao longo de uma gestão. Estruturas dimensionadas, tanto em relação ao perfil de conhecimento requerido como em número de pessoas disponíveis para executar a tarefa, poderiam ficar ociosas após concluído o ciclo de desenvolvimento de produtos.

4 Fatores relevantes

Frente ao cenário acima apresentado, o processo de terceirização surge como uma alternativa para o equacionamento destas questões. Entretanto, no âmbito de uma empresa pública de informática ou do setor de informática de uma instituição pública, alguns fatores relevantes devem ser considerados na implementação desta alternativa. Podemos observar que estes fatores são de grande importância para a sucesso de uma implementação desta natureza e, ao mesmo tempo, o sucesso do processo de terceirização passa a ser relevante para o êxito do encaminhamento destes outros fatores. Enfim, o que pode ser observado é que esta questão de terceirização não pode e nem deve ser vista como um fim em si mesma, mas como um componente de um processo maior, que é a mudança do papel do Estado, do qual depende e, ao mesmo tempo, é parte integrante, sendo um dos fatores mais importantes. Os fatores a serem observados não se restringem aos que estão listados, mas estes foram os mais relevantes para o programa de terceirização da Celepar.

Redefinição dos papéis e atribuições da empresa pública de informática:

Esta redefinição é estratégica, passando por um novo posicionamento da empresa pública de informática. Em síntese, esta deve passar a ser uma gestora do processo de informatização do setor público e não necessariamente só uma executora deste processo. Se não houver este reposicionamento, a tendência é a empresa deixar de atender às demandas existentes, tornando-se uma espécie de "gargalo" no processo, ou o Estado perder a gestão do seu pesso de informatização, que passa a ocorrer com diversos agentes, sem uma condução especializada e agregadora. Esta mudança não é um processo simples. Exige um claro entendimento, uma conscientização dos diversos níveis envolvidos e, principalmente, a adoção de medidas que realmente tornem esta mudança realidade. Uma das medidas passa ser a mudança do perfil de atuação dos seus técnicos da área de desenvolvimento, para passarem a fazer a gestão de projetos contratados junto a terceiros.

Atenção aos aspectos culturais associados:

Um grande fator de sucesso na implementação é a atenção aos aspectos culturais associados, especialmente do corpo funcional da empresa que está buscando esta alternativa, devendo ser discutida e apresentada, com clareza, a proposta da redefinição do papel da empresa. Deve ser buscado que os funcionários entendam isto como sendo uma real oportunidade e não uma ameaça. Devemos mostrar que se abre uma nova, e igualmente especializada, frente de trabalho na gestão de projetos e concepção de soluções, que pode ser vista como uma alternativa na evolução de carreira dos técnicos da empresa. Características do corpo funcional em relação ao conhecimento do negócio do cliente devem sempre ser valorizadas e é um ponto fundamental na condução do processo de terceirização.

No encaminhamento deste fator, deve ser levado a efeito um programa de treinamento, ações constantes de esclarecimento, avaliação e redirecionamento de atividades em nível individual, respeitando que nem todos possuem perfil adequado para gestão de projetos. Muitos deverão e precisarão continuar a fazer o que sempre fizeram, outros poderão ter mudanças mais discretas e assim por diante. Isto deve ser identificado e tratado individualmente e deve estar associado a um programa de avaliação de desempenho e de evolução de carreira.

No aspecto aqui tratado, cabe também muita atenção para diferenciar as reais dificuldades inerentes a uma mudança desta natureza, das dificuldades postas como fator de resistência à mudança.

Busca de um nível de maturidade do processo de desenvolvimento de software da empresa pública:

Um fator fortemente associado à possibilidade de contratação de terceiros no desenvolvimento de software é o nível de maturidade do processo de desenvolvimento da empresa contratante (no caso da empresa pública). Como referência, o SEI -Software Engineering Institute- desenvolveu um modelo, o CMM – Capability Maturity Model (Modelo de Capacitação e Maturidade) [1], que enquadra organizações de desenvolvimento de software em estágios (ou níveis) de maturidade. São cinco níveis que são compostos, numa primeira divisão, por áreas chaves, que indicam o foco de atenção associado a cada nível. Segundo o modelo, os níveis são evolutivos e as organizações não conseguem "pular" níveis. O modelo apresenta algumas características de organizações com baixo nível de maturidade:

  • os resultados dependem, basicamente, da competência e, muitas vezes, do heroísmo das pessoas que o fazem;

  • é verificada uma grande dificuldade de inserção de novas técnicas, ferramentas ou tecnologias nas organizações;

  • os resultados são imprevisíveis, tanto para positivo como para negativo;

  • pouca, ou nenhuma, visibilidade do processo de desenvolvimento de software;

  • previsões e medições são quase impossíveis;

  • o que resta de um processo de desenvolvimento, espera-se, é o produto final;

  • os grandes problemas não são técnicos, são gerenciais.

Ainda segundo o SEI, numa pesquisa de 1993 realizada em 261 organizações que desenvolvem software nos mais diversos países, constatou-se que, aproximadamente, 75% destas organizações estão com seus processos com características como as acima apresentadas, que correspondem ao nível 1 do modelo CMM. Empresas com estas características terão grandes dificuldades, se não impossibilidade, de praticar um processo de terceirização segundo o contexto aqui abordado. Para viabilizar o processo de terceirização deve ser buscado um processo mais maduro, desenvolvendo algumas características como:

  • ser construído sobre o fundamento de gerenciamento de projeto de software;

  • ser um processo definido, documentado e entendido;

  • as saídas de uma atividade devem fluir naturalmente para as entradas das próximas atividades;

  • funções e atividades no processo devem ser definidas e entendidas;

  • a produção do software deve ser visível e possível de ser acompanhada através do processo de desenvolvimento de software;

  • esforços e custos devem ser previstos e acompanhados.

Este segundo conjunto é característica típica de uma organização no nível 2 do modelo CMM, a qual possibilita a prática de um processo de terceirização mais seguro. Assim sendo, as empresas públicas precisam investir na melhoria do seu processo produtivo de software, para dotá-lo de características que o tornem menos dependente das pessoas que o executam, passando a ser executado segundo um processo estabelecido e descrito. Neste contexto, um terceiro terá facilidade de se posicionar como mais um agente num processo de desenvolvimento, com papéis, produtos, responsabilidades, formas de acompanhamento e gerenciamento mais bem definidos.

Segundo o modelo, o primeiro nível de evolução é alcançado tratando-se de aspectos gerenciais e não técnicos. Tomando ainda como referência o modelo CMM, ele apresenta que as questões que devem ser tratadas num primeiro momento, que são as áreas chaves do nível 2, são:

  • gerenciamento de requisitos;

  • planejamento de projeto de software;

  • acompanhamento de projeto de software;

  • gerenciamento de subcontratação de software;

  • garantia de qualidade de software;

  • gerenciamento de configuração de software.

Busca de ganhos adicionais, além do aumento da capacidade produtiva:

Outro fator relevante é a busca de outros ganhos oriundos da implantação de um processo de terceirização. A empresa deverá, necessariamente, buscar uma organização do seu processo produtivo, conforme descrito anteriormente. A melhoria do processo proporciona um ganho adicional significativo também nas atividades que passam a ser desenvolvidas internamente, sem a participação de terceiros. Estas atividades passam a ter um melhor nível de especificação, de gerenciamento, de utilização de métrica e respectiva estimativa de esforço/custo. Enfim, a empresa se vê praticamente obrigada a desenvolver e implementar um processo metodológico. A cobrança que passa a ser feita dos terceiros pode servir, muitas vezes, como exemplo e explicitação de aspectos que internamente não são tratados. Este processo pode nos colocar num papel diferenciado, que permite uma crítica como espectador de um processo, e, ao mesmo tempo, uma crítica da nossa própria forma de trabalho. Podemos, como ganho adicional, ver que algumas coisas que, por vezes, não fazemos, são possíveis de serem feitas num processo de desenvolvimento.

Agilidade nas contratações:

Um outro fator determinante no sucesso de um processo de terceirização, é a busca de agilidade no processo de contratação de serviços junto ao mercado. Faz-se necessário o desenvolvimento de mecanismos de contratação que atendam à dinâmica das demandas. São comuns demandas que surgem para serem atendidas em curto espaço de tempo. Isto é ainda mais importante quando levamos em conta os aspectos legais envolvidos nas contratações feitas pelo setor público (em especial a lei 8666). Um processo licitatório acaba levando, no mínimo, 60 dias. A este tempo, deve ser computado o prazo para a empresa contratada montar a estrutura necessária, entender o ambiente e o negócio envolvido e começar a trabalhar.

Evitar a simples alocação de mão-de-obra:

A terceirização não pode se dar a partir de uma simples alocação de recursos (homens/hora) para o desenvolvimento junto às equipes e aos técnicos da empresa. Poderia ser entendido como uma contratação disfarçada de mão-de-obra e não atenderia aos demais aspectos que influenciam positivamente, tratados anteriormente. Outro fator importante e que muitas vezes é renegado, é a diferença de remuneração que uma situação desta pode deflagar, fazendo com que seja gerada uma situação de "caos" dentro da empresa, tornando tanto os funcionários como terceiros insatisfeitos com a remuneração, além de eventuais problemas trabalhistas com alocação de recursos no local físico da empresa.

Estímulo ao aumento da capacitação do setor privado:

Um último fator que deve ser levado em conta neste processo de terceirização é que ele deve contribuir expressivamente para o aumento da capacitação e crescimento do mercado privado de produção de software. Modelos como o CMM surgiram do governo americano como instrumento de seleção de empresas para desenvolvimento de software. Mecanismos que certamente contribuíram para a elevação do nível de qualidade e produtividade do segmento como um todo. O governo, como contratante de serviços, deve levar em conta esta variável e, em suas ações, estimular o desenvolvimento de todos os segmentos produtivos da sociedade. Neste cenário, as contratações para desenvolvimento de software devem privilegiar empresas que possuam evidências reais de processos organizados e qualidade nos serviços que produzem. O fato do governo contemplar estes aspectos nas suas contratações deve estimular uma constante busca de melhoria por parte das diversas empresas envolvidas no processo. A melhoria alcançada pode ser um diferencial competitivo, não só junto ao próprio governo, mas também junto a outros mercados, nacionais ou internacionais, tendo, a partir daí, a comunidade um retorno social e o governo um aumento de arrecadação através de impostos.

5 A experiência da Celepar

A experiência que vem sendo desenvolvida pela Celepar está inserida no contexto acima descrito. Os fatores estão fortemente presentes e são balizadores para a condução do processo de terceirização no desenvolvimento e manutenção de software.

A questão primordial para o sucesso do projeto é a redefinição do papel da Celepar junto ao Estado do Paraná. De uma empresa mais voltada para o desenvolvimento e realização de serviços, passou a ser, a partir de definições da política estadual de informática, a empresa responsável e gestora do processo de informatização do Estado. Esta situação desencadeou uma série de ações internas, visando com que a empresa se tornasse capaz de desempenhar o novo papel estabelecido. Uma das ações foi a busca de uma forma de aumento da capacidade de produção de serviços, contando com recursos de fornecedores e passando a fazer uma gestão destes serviços contratados junto ao mercado. Passou a ser uma questão fundamental poder oferecer uma quantidade de serviços superior à capacidade de produção interna.

Na busca do aumento da capacidade produtiva, temos procurado adotar uma prática que seja ágil do ponto de vista de contratação e que também evite o aspecto anteriormente abordado de simples alocação de mão-de-obra.

Esta prática está pautada em processos de contratação abrangentes, que são feitos em pontos por função. Estes contratos suportam o desenvolvimento de diversos sistemas e/ou rotinas, em diversas plataformas e tecnologias. Não se contrata o desenvolvimento de um único projeto, mas uma quantidade de pontos por função que viabilize a execução de diversos serviços. Temos procurado fazer contratos que supram a necessidade adicional de desenvolvimento por, aproximadamente, dois anos. Desta forma, evita-se o processo burocrático a cada necessidade que surge.

A contratação na modalidade de pontos por função evita a prática da alocação da mão-de-obra, pois o que está se contratando não é o recurso humano (programador ou analista), mas um serviço pré-dimensionado. O fornecedor pode ter ganhos significativos a partir do momento que consiga estabelecer um processo mais produtivo. Quanto menos recursos forem gastos para fazer o serviço, mais vantagens financeiras terá.

A nossa experiência também não é exclusivamente nesta modalidade de contratos. Temos desenvolvidas uma série de contratações direcionadas a projetos específicos. Entretanto, estes contratos tendem a diminuir e serem substituídos por contratos em pontos de função devido à flexibilidade oferecida por estes.

Outra questão que tem sido alvo de constantes preocupações e ações de melhoria é o estabelecimento de um processo metodológico de desenvolvimento e manutenção de software. Este esforço vem ocorrendo já há algum tempo, e não está associado, exclusivamente, a esta questão de terceirização. É um esforço que vem sendo feito buscando dotar a Celepar de um processo que garanta produtos com qualidade para os nossos Clientes. Entretanto, entendemos que é um fator predominante no sucesso de uma iniciativa de terceirização. A inexistência de um processo de desenvolvimento que privilegie não só os aspectos técnicos e de engenharia, mas também os aspectos de gerenciamento, praticamente impossibilita a contratação de terceiros na forma como aqui está sendo tratada. A Celepar tem buscado aperfeiçoar o seu processo de desenvolvimento a partir de referências do modelo CMM – Capability Maturity Model e de outras normas internacionais que tratam do assunto, em especial da NBR 13596[2] (ISO/IEC 9126) - Avaliação de Produto de Software – Características de Qualidade e Diretrizes para o seu Uso, e ISO/IEC 12207[3] – Processos de Ciclo de Vida de Software. O modelo CMM tem sido usado para estabelecer um caminho de melhoria no processo de desenvolvimento. A norma ISO/IEC 12207 vem sendo usada como referência para a estrutura e identificação dos componentes do processo de desenvolvimento de software e a norma NBR 13596, como subsídio para identificação das características de qualidade do software que devem ser tratadas em nível de especificação de requisitos e de avaliação do produto de software. A experiência tem nos mostrado que, quanto mais estabelecido e gerenciado estiver um processo de desenvolvimento, mais êxito se tem em diversas iniciativas, inclusive na contratação de terceiros.

Constatou-se que o processo de terceirização, na forma que vem sendo praticado, tem trazido alguns ganhos adicionais. Decorrente deste processo, houve a aceleração da implantação de alguns aspectos metodológicos, em especial de gerenciamento. Também tiveram de ser desenvolvidos mecanismos mais refinados de testes e aceitação de produtos mais objetivos e com maior rigor técnico, já que as regras de aceitação de um produto devem estar previstas em contrato. Tiveram de ser resgatadas práticas de especificação de projetos e programas. Houve a necessidade de se trabalhar mais com medições e estimativa de tamanho, pontos por função, e outras vantagens adicionais de conscientização da importância de se ter documentação de processos, padrões, ferramentas da empresa, para serem repassados aos terceiros.

Outro fator interessante é a troca de informações e o aprendizado que a terceirização traz, pois todas as empresas possuem uma cultura própria que, muitas vezes, não é questionada pela organização. Quando se inicia um projeto em conjunto, muitos procedimentos são questionados e, neste momento, existe a oportunidade de se trocar experiências que, sem dúvida, são enriquecedoras e contribuem para a melhoria. Nesta troca, o que mais se evidencia é a assimilação de novas tecnologias e processos de trabalho, a verificação da necessidade de maior padronização do processo de desenvolvimento e de melhoria na documentação parcial/final dos produtos, o aperfeiçoamento do processo de planejamento e acompanhamento de projeto e a troca interna de experiências. A constatação interessante é que este processo ocorre tanto do lado do contratante quanto do fornecedor.

De forma complementar a estas questões, temos buscado privilegiar empresas que apresentem um diferencial de qualidade nos seus processos e produtos. Acreditamos que esta ação estimule ainda mais a busca pela qualidade que o mercado já vem desenvolvendo.

5.1 Benefícios

A experiência de terceirização tem nos trazido diversos benefícios, cabendo destacar:

  • possibilitou um posicionamento junto aos nossos clientes mais próximo do papel estabelecido, de gestora do processo de informatização;

  • aumentou a capacidade produtiva relacio-nada a desenvolvimento e manutenção de software, facilitando o atendimento às demandas dos Clientes, em benefício do Cidadão;

  • possibilitou e estimulou o aperfeiçoamento dos processos produtivos e de gestão na área de desenvolvimento e manutenção de software;

  • contribuiu para o desenvolvimento/cresci-mento do mercado de desenvolvimento de software, tanto em nível quantitativo como qualitativo;

  • possibilitou a troca de experiências com empresas do mercado, onde foi possível tanto passar como receber experiências;

  • auxiliou na mudança de cultura interna, fazendo-a acontecer, mostrando que existem alternativas viáveis de busca de soluções para os nossos Clientes;

  • incentivou a procura de soluções metodológicas dentro de modelos já conhecidos nacional e internacionalmente, em vez de soluções próprias.

5.2 Dificuldades

Como em todos os processos novos e de mudanças, também neste tivemos, e ainda temos, dificuldades a serem administradas, cabendo destacar:

  • gerenciamento de uma mudança desta natureza. É uma mudança bastante significativa de forma de trabalho, que atinge muitas pessoas e que não pode ser tratada de forma isolada;

  • aspectos associados aos processos licitatórios (tempos requeridos, processo de pontuação e seleção, legislação...). A busca de uma prática que minimize barreiras é uma das maiores dificuldades. Ao mesmo tempo que elas vão sendo equacionadas, outras aparecem;

  • processo metodológico de desenvolvi-mento e manutenção de software ainda não totalmente consolidado. Isto ocorre muitas vezes pela falta de um formalismo de como executar determinada atividade. Esta dificuldade pode ser observada e acaba contribuindo no estabelecimento de um plano de melhoria de processos;

  • pouca experiência em definição de critérios e utilização de mecanismos mais formais para aceitação de produtos;

  • dificuldade no repasse do serviço, envolvendo forma de especificação, de repasse dos dados e condições de teste, entre outras;

  • falta de definição de papéis, de responsabilidade e do estabelecimento de uma estrutura comum de comunicação entre a empresa contratante e a fornecedora;

  • dificuldade na gestão de múltiplos projetos, elevando o nível de complexidade do processo;

Apesar das dificuldades, o processo tem apresentado bons resultados. Entendemos que o fundamental é que o processo de terceirização de atividades de desenvolvimento e manutenção de software, no âmbito do setor público, deve ser encarado como um dos componentes de um processo de mudança, sendo, por um lado, necessário para alavancar esta mudança e, por outro lado, tornando-se inviável de forma isolada, sem estar inserido neste contexto mais abrangente.

Um fato visível é que não temos mais o questionamento sobre a terceirização, se ela é boa ou não. Hoje, o corpo funcional está mais preocupado em observar a experiência adquirida, verificando em que casos a terceirização é mais viável. Este foco de atenção tem mostrado que estamos aprendendo com o processo e buscando aperfeiçoá-lo, em vez de questioná-lo. Para a empresa, a terceirização é uma forma de aumento da capacidade produtiva e um meio de atendimento ao cliente.

Mas, sabemos que ainda temos um longo caminho de mudança a percorrer, pois se faz necessário, em muitos casos, passarmos por uma mudança do termo "terceiros" para "parceiros". Esta é ainda uma meta a ser alcançada, pois exige, tanto da Celepar como dos "parceiros" e do cliente, um amadurecimento no processo, possibilitando uma definição mais clara de papéis, responsabilidades, e de como trabalhar juntos para termos maiores ganhos.

Referências Bibliográficas:

[1] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13596 : Tecnologia de Informação - Avaliação de Produto de Software - Características de Qualidade e Diretrizes para o seu Uso. Rio de Janeiro : ABNT, 1996. (Versão brasileira da Norma ISO/IEC 9126, 1991).