Memória Organizacional

Autor: Hugo Eduardo Simião - GAC  

Introdução

Memória organizacional é coisa de museu? Bem, não há nada de errado em uma organização preservar os objetos que lembram momentos relevantes de sua história. De fato, muitas organizações mantêm acervos dignos de verdadeiros museus e, provavelmente, em qualquer organização é possível encontrar muitos objetos que merecem ser preservados. Entretanto, o que é abordado neste texto como Memória Organizacional é o que, em inglês, é conhecido como corporate memory, enterprise memory ou organizational memory, assunto relacionado com a Gestão do Conhecimento.

O que é Memória Organizacional

Embora a preocupação com o acervo de informações seja quase sempre contemporâneo à própria criação da organização, somente na segunda metade da última década esse assunto passou a merecer destaque, como uma área específica de pesquisa científica e de prática dentro das organizações.

A principal função de uma Memória Organizacional é aumentar a competitividade da organização, pelo aperfeiçoamento da forma como ela gerencia seu conhecimento[1]. Nesse sentido, a Memória Organizacional não é apenas um acervo de informações. Ela é também uma "ferramenta" da organização para o gerenciamento de seus ativos intelectuais. Sua existência deve propiciar maior compartilhamento e reuso do conhecimento corporativo, do conhecimento individual e das lições aprendidas na execução das tarefas da organização. A Memória Organizacional deve permitir responder às principais questões que se faça sobre a organização, seu ambiente, seus processos e produtos. Deve ainda funcionar como um serviço inteligente e ativo, capaz de colocar à disposição de quem tenha que executar determinada tarefa, no tempo certo, as informações necessárias para o trabalho.

Figura 1: A Memória Organizacional interage com todas as atividades básicas da Gestão de Conhecimento - adaptado de ABECKER[1]

Utilidade de uma Memória Organizacional

Mas por que precisamos de uma Memória Organizacional? Uma das razões é o crescimento explosivo do número de documentos com os quais temos que lidar. Nos Estados Unidos são criados mais de 400 novos documentos por ano, em média, por habitante (só contados os documentos em papel). E na área empresarial não é raro que até cerca de 20 cópias de certos documentos sejam mantidas em diferentes lugares e por diferentes pessoas na organização[2]. Que dizer então dos documentos eletrônicos? De fato, a maior disponibilidade de computadores, editores de texto e programas de correio eletrônico, a Internet, entre outros, facilitaram em muito a criação ou obtenção de novos documentos.

Hoje, a tecnologia disponível garante uma boa solução para o armazenamento desse imenso volume de documentos. Mas, quando é preciso encontrar um documento... Usualmente criamos pastas e diretórios no disco do computador, e neles depositamos nossos arquivos. Mas depois não lembramos em qual deles deixamos o arquivo que precisamos no momento. Às vezes não lembramos do nome dado ao arquivo. E se quisermos, então, recuperar algumas informações da situação, do contexto da época em que o arquivo foi criado, temos que nos conformar com a impossibilidade de ter essas informações. Mais ainda, se quisermos recuperar o que temos armazenado sobre um determinado assunto, temos que nos armar de paciência (e talvez de alguns colaboradores) para realizar uma busca infindável em milhares de arquivos. E provavelmente restarão "escondidos" documentos importantes. Também deveríamos poder responder a questões do tipo: "por que fizemos isso?" ou "como fizemos isso?". Um exemplo clássico das consequências da falta dessas informaçoes é o da usina nuclear francesa que, embora obsoleta, não pode ser desativada porque não há registros dos procedimentos necessários para sua desativação. As plantas de engenharia não trazem informações necessárias ao processo de desligamento e as pessoas que sabiam como fazer já morreram.

Tudo isso pode ser traduzido, quantitativamente ou qualitativamente, em custos e também em riscos. O tempo para localizar um documento, ou para criá-lo, ou para obtê-lo novamente. O tempo em que a atividade que dependia desse documento ficou "parada", à espera das informações necessárias. O custo de não encontrar a informação necessária, que se sabe existir. O risco da dilação do prazo para a conclusão da tarefa. O risco de implicações de ordem econômica, fiscal e legal, pela impossibilidade de recuperar determinadas informações. Embora essa situação seja reconhecida como um problema em quase todas as organizações, são raras as que têm uma atenção efetiva para a gestão dos recursos que constituem seu capital intelectual e raríssimas as que têm isso institucionalizado em sua estrutura.

Em busca de uma solução

Uma solução para esse problema é um dos objetivos mais importantes da Gestão do Conhecimento e, em especial, das soluções baseadas em Memória Organizacional. Mas as experiências desenvolvidas até aqui mostram que é preciso mudar de paradigma para atingir resultados realmente significativos. O enfoque de gestão documental, já bastante difundido, que é embasado fortemente em documentos como objetos a serem armazenados e recuperados, não tem se mostrado suficiente. É necessário incluir uma visão de processo, que considere questões de contexto, tanto da época de criação do documento, como também de todos os eventos que o afetam. E que além disso, trate das interconexões entre o documento e os outros elementos do seu universo de referência. Sistemas de gestão do conhecimento não são sistemas de processamento automático de dados e, portanto, iniciativas de gestão de conhecimento facilmente falham se são concebidas como um problema tecnológico. Sistemas de gestão de conhecimento e de Memória Organizacional são, essencialmente, sistemas sociais[4]. Para a gestão desses recursos é necessário um novo tipo de sistema, que provavelmente use tecnologias como Workflow, Groupware, Hipertext e modelos conversacionais, tipicamente apoiados em Ontologias[3]. Esse novo tipo de sistema tem que tratar com informação incompleta, potencial-mente incorreta e frequentemente alterável. Ele tem que ser mais do que um sistema baseado em conhecimento. Ele deve funcionar como um "assistente inteligente", para as pessoas. Especialmente para aquelas que devem realizar tarefas que exigem uso intensivo de conhecimento. Ele deve ser um verdadeiro parceiro dessas pessoas na resolução de problemas.

Conclusão

Este texto faz uma abordagem bem geral e resumida sobre o que é Memória Organizacional e sua importância para as organizações. Aborda de forma sintética algumas das razões para uma organização implantar um sistema de Memória Organizacional e descreve as características básicas desse tipo de sistema. Sendo um material introdutório, esse texto requer outros textos complementares, que estenderão os conceitos dessa área e detalharão os componentes de um sistema baseado em Memória Organizacional.

Referências


[1] ABECKER, A. et al. Toward a technology for organizational memories. IEEE Intelligent Systems, Los Angeles, v. 13, n. 3, p. 40-48, May 1998.

[2] CUADRA ASSOCIATES. The corporate memory and the bottom line. Disponível em: http://www.cuadra.com/cuadra/ corpmem.html. Acesso em: out. 2001.

[3] CONKLIN, E. J. Capturing organizational memory. Group Decision Support Systems, 1996. Disponível em: http://www.gdss.com/wp/COM.htm. Acesso em: set. 2001.

[4] TUOMI, I. Data is more than knowledge: implications of the reversed knowledge hierarchy for knowledge management and organizational memory. In: THE 32nd HAWAI INTERNATIONAL CONFERENCE ON SYSTEM SCIENCE, 1999. Maui. Proceedings... Maui, 1999.